Se você fizer uma busca rápida na internet sobre o significado de “cultura pop”, o resultado será algo assim: “Cultura pop, ou cultura popular, é um conceito que engloba as manifestações artísticas, sociais e culturais que se tornam populares e são amplamente consumidas por um grande público. A cultura pop inclui filmes, séries e outros fenômenos que conectam pessoas e influenciam comportamentos e tendências”.
Levando esta definição em consideração, eu posso dizer que, se este significado de “cultura pop” estivesse em algum dicionário, ele poderia facilmente ser exemplificado por “Lilo e Stitch”. A animação original, dirigida por Chris Sanders e Dean DeBlois em 2002, ressoa até hoje, tanto no público infantil quanto nos adultos. Além de diversos produtos vendidos daquele adorável (mas nem tanto) bichinho azul, o filme da Disney introduziu a inesquecível palavra “Ohana” no vocabulário das pessoas. Termo este que “quer dizer família e família quer dizer nunca abandonar ou esquecer”. E como é bom ver que a nova adaptação em live-action do estúdio traz de volta às telas essa cativante história, respeitando a sua essência.
Dirigido por Dean Fleischer Camp (de “Marcel, a Concha de Sapatos”), “Lilo e Stitch” (2025) narra uma linda amizade entre uma menina humana e um alienígena fugitivo, o experimento 626. O depois nomeado de Stitch (voz de Chris Sanders) é adotado como animal de estimação por Lilo (Maia Kealoha), uma imaginativa e rebelde garota havaiana, e juntos eles defendem o significado de família.

Sabemos que as versões em live-action de animações clássicas não conseguem fugir das comparações, e geralmente sobrevivem delas para continuar na boca do povo (apesar de muitas serem injustas). Então, vamos a elas. É importante dizer que o filme deste ano preserva todo o significado do longa original. A amizade, o amor, a comédia, assim como o encanto da história, continuam presentes no roteiro assinado por Chris Kekaniokalani Bright e Mike Van Waes. Mas o acerto principal da produção foi a escolha da atriz que interpreta a protagonista.
Na animação, Lilo é uma garota que transborda fofura, mas, ao mesmo tempo, é dona de uma personalidade forte. Muito agitada, sensível, esperta e comunicativa, a menina é admirável no filme de 2002 e segue sendo a mesma criança carismática aqui em 2025. A havaiana Maia Kealoha, de oito anos (quando filmou o longa, tinha seis), traz para as telas, de forma graciosa, todo o jeito adorável da pequena. Novamente é possível acompanhar as travessuras de Lilo e torcer por seu final feliz, que ela tanto almeja, com uma família unida e com vários amigos em volta.
Assim como acontece em várias dessas adaptações em live-action, “Lilo e Stitch” foi cercado de polêmicas acerca da escolha dos atores que interpretaram os personagens queridos da animação. Por exemplo, os cineastas revelaram que o Agente Pleakley passaria a maior parte do filme na forma humana, sendo representado por Billy Magnussen. O fato deixou os fãs desconfiados e descontentes, afinal, um dos pontos marcantes da animação é o disfarce de Pleakley para esconder sua origem alienígena, sempre com roupas e acessórios extravagantes femininos.

Mas adaptações são necessárias para um live-action acontecer. Seja por economia ou em prol do próprio andamento do enredo, os produtores escolheram que o personagem teria mais tempo de tela como humano, e essa escolha não atrapalha em nada a sua participação. E é isso que importa, não é mesmo? As falas de Pleakley, seu amor pela Terra, seu jeito atrapalhado e sua interação com Jumba continuam na narrativa.
O mesmo acontece com Jumba (Zach Galifianakis dá voz e também forma ao personagem), que tem sua importância na trama preservada, mesmo com a adaptação realizada. Vale ressaltar que, em ambos os casos, o CGI é muito bem aplicado. O que também acontece com o outro protagonista: Stitch. O alienígena azul continua sendo assustador e bagunceiro. Sua aparência grotesca, seu jeito estabanado, sua rapidez e suas caretas são bem retratadas por meio da computação gráfica, assim como suas principais falas e sua personalidade amável (nem sempre, claro) são mantidas.
A maior adaptação no elenco fica por conta de Cobra Bubbles (interpretado por Courtney B. Vance). Na animação, ele é o assistente social com cara emburrada, mas que, no fundo, torce para que os problemas da família de Lilo sejam resolvidos. Aqui, Bubbles é um agente da CIA com a missão de encontrar possíveis alienígenas. Em termos de narrativa, é interessante a adaptação, pois ele agora tem um papel ainda mais importante para o desfecho da história, mas o problema é a substituta dele.

A assistente social Mrs. Kekoa (Tia Carrere) não transmite a bravura e rigidez da personagem da animação, o que quebra a dinâmica de Lilo e sua irmã temerem a profissional e lutarem para que as coisas deem certo, com medo dela ser dura demais com as jovens. A verdade é que Kekoa é totalmente o oposto da versão de 2002. Apesar de ser um erro, não é tão incômodo assim, afinal, ela não tem tanto tempo de tela.
Infelizmente, o principal erro fica com uma personagem crucial: Nani (Sydney Agudong). A irmã de Lilo é essencial para o arco dramático da pequena com Stitch, e a história se desenvolve devido aos problemas que passam por ela. Além disso, os diálogos mais emocionantes da trama são protagonizados pela jovem, que é uma mistura perfeita de raiva, sensibilidade, amor e responsabilidade, típicas características encontradas em irmãs mais velhas e ressaltadas quando elas precisam tomar o papel principal na família.
Mas nada disso é apresentado no longa live-action. Nani não se emociona (e consequentemente não emociona a quem assiste) em quase nenhuma cena, e assim é quase impossível acreditar que ela está verdadeiramente triste com a possibilidade de perder a guarda da irmã. Durante todo o filme, a impressão que fica é que Nani está conformada com a situação e que a decisão não a afeta, o que é totalmente diferente do que acontece na obra original, onde vemos a sister se desesperando em todos os momentos em que perder Lilo se torna um perigo iminente. A falta de carisma e emoção desta personagem só não estraga tudo porque a trama está amplamente ligada à protagonista, que tem talento de sobra e carrega nas costas as cenas em que as duas estão juntas.

Voltando a falar sobre adaptações, o filme acerta na grande maioria delas. Trazer uma nova personagem para a história foi uma ótima escolha. A vizinha Tutu (Amy Hill) dá mais humanidade para o enredo e deixa o significado de Ohana ainda mais amplo e amoroso. Algumas cenas de ação cômica protagonizadas por Lilo e Stitch também sofrem mudanças, mas, no geral, se encaixam bem no contexto de um filme live-action.
E a emoção, que é um ponto essencial quando o assunto é “Lilo e Stitch”, é garantida. O novo filme mostra mais sobre os pais das garotas, principalmente da mãe, e é tocante ver a menina se encantar ao falar ou ver as fotos da matriarca. A morte deles é mencionada de uma forma que explica ao público o que aconteceu, mas de maneira sutil e comovente.
“Lilo e Stitch” entra para a prateleira de acertos recentes da Disney, e não só por representar os personagens de formas parecidas com os da animação, mas sim por manter e respeitar a essência doce, engraçada e sensível da narrativa. E claro, por trazer, na forma mais genuína de traduzir Ohana, uma das duplas mais amadas da cultura pop. ■
LILO & STITCH (2025, EUA) Direção: Dean Fleischer Camp; Roteiro: Chris Kekaniokalani Bright, Mike Van Waes (baseado no roteiro de 2002 escrito por Chris Sanders e Dean DeBlois); Produção: Jonathan Eirich, Dan Lin; Fotografia: Nigel Bluck; Montagem: Adam Gerstel, Phillip J. Bartell; Música: Alan Silvestri; Com: Sydney Elizebeth Agudong, Chris Sanders, Tia Carrere, Hannah Waddingham, Courtney B. Vance, Judge Reinhold, Zach Galifianakis, Maia Kealoha; Estúdio: Walt Disney Pictures; Distribuição: Disney; Duração: 1h 48min.