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“Ritas” e a liberdade deixada sem tabu por Rita Lee

"Ritas" (2025) - Biônica Filmes/Divulgação

"Ritas" (2025) - Biônica Filmes/Divulgação

Um documentário póstumo narrado em primeira pessoa é sempre algo inventivo, mas um documentário póstumo narrado em primeira pessoa por Rita Lee é genial. Vimos esse formato narrativo ser usado recentemente em “Senna por Ayrton” (2024), mas, diferente do filme sobre o ídolo da Fórmula 1, Rita parece ter presenteado os fãs, seja com dois livros autobiográficos (“Rita Lee: Uma Autobriografia” e “Rita Lee: Outra Autobiografia”), seja com vídeos de depoimentos revisitando sua própria história.

Neste processo de busca sobre quem foi e os feitos que alcançou como artista e pessoa, ela revisita sua trajetória e se reapresenta aos fãs como pessoa diferente da persona pública. Apesar de no começo dizer que a persona Rita Lee dividiu a jornada com a pessoa Rita, é difícil dizer o quanto isso é verdade. Afinal, uma artista tão autêntica e espontânea quanto ela às vezes se engana pela própria modéstia de não se ver tão grande quanto é.

O título “Ritas” brinca com essa estética e ousadia que ela teve de se reinventar em uma época em que o rock era dominado por homens. O documentário — dirigido pelo montador Oswaldo Santana, em codireção com Karen Harley — acerta ao trazer informações combinadas a um trabalho gráfico com animações psicodélicas que se conectam ao estilo de Lee, e que também revelam um lado dela que não era tão público: o do desenho. Essa preocupação estética em ligar os atos do longa com intervenções ilustradas fica bonito na tela e entrega um pouco mais de poesia para os conhecidos fãs de carteirinha da cantora.

"Ritas" (2025) - Biônica Filmes/Divulgação
“Ritas” (2025) – Biônica Filmes/Divulgação

Mas é a voz de Rita que de fato nos guia através dos desenhos, músicas, recortes de revistas e jornais. Rita olha para a câmera e se mostra como uma artista transparente e sincera, como sempre foi. Essa sensação do olhar para a plateia é cativante. É como se estivéssemos sentados na sala ouvindo Rita contar a história que ela protagonizou. Trechos de entrevistas que ela concedeu completam os capítulos que ela não narra diretamente.

Como era de se esperar, a música também dita os atos do longa. O filme é permeado por trechos de videoclipes e shows com hits nacionais, mas também de algumas canções que podem ser desconhecidas das novas gerações, como “On the Rocks”. As músicas embalam os espaços criados entre cada novo assunto e conferem dinamismo ao documentário.

Mesmo com tantos elementos, a sensação que se tem de “Ritas” é de um filme contemplativo, por vezes com um ritmo lento. Essa escolha o deixa ainda mais interessante, porque começamos com um comunicado de Rita Lee mudando sua data de aniversário, cortando para uma animação psicodélica e na terceira cena voltando para um vídeo em que Rita caminha calmamente pelo jardim de sua casa, a fim de olhar o horizonte ao chegar no topo.

"Ritas" (2025) - Biônica Filmes/Divulgação
“Ritas” (2025) – Biônica Filmes/Divulgação

A humanização do envelhecer, mostrando como Rita se manteve atenta e atualizada ao longo da vida, é algo que o longa faz bem. A vovó que deixa a neta escutar músicas proibidas e ama os animais é uma imagem bonita e que dá um aconchego a quem ama a obra dessa mulher tão importante para a liberdade.

A falta de tabu sempre existiu na vida de Rita Lee. A liberdade do sol e lua na cabeça, da entrada e saída das drogas, de bancar seu amor e de defender os animais são pequenos exemplos de toda a sua grandiosidade como pessoa e artista. “Ritas” ao final se torna uma celebração e linda homenagem feita, de certa forma, pela própria Rita para seus fãs. ■

Nota:

RITAS (2025, Brasil). Direção: Oswaldo Santana, Karen Harley; Roteiro: Oswaldo Santana, Karen Harley, Fernando Fraiha; Produção: Bianca Villar, Fernando Fraiha, Karen Castanho; Fotografia: Janice d’Avila; Montagem: Oswaldo Santana; Com: Rita Lee, Roberto de Carvalho; Estúdio: Biônica Filmes; Distribuição: Biônica Filmes, Paris Filmes; Duração: 1h 23min.

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