"Sangue e Água" (Blood & Water, 2020) - Distribuição: Netflix
Distribuição: Netflix

“Sangue e Água” ou apenas redemoinhos

Um redemoinho. É assim que eu classificaria a série da Netflix “Sangue e Água”. Apesar de ter muitos aspectos técnicos interessantes, como alguns enquadramentos, a fotografia e o uso da luz, além de um ótimo elenco, a produção sul-africana, um dos primeiros investimentos da plataforma no país, peca em seu roteiro. Como acontece nos redemoinhos, nós ficamos presos em um movimento espiral, rodando em círculos e sem chegar a muitos lugares dentro da história, ou pior, a lugares extremamente óbvios.

Com apenas seis episódios, a trama traz a história da família Khumalo, que teve a sua primogênita sequestrada, ainda recém-nascida. Logo na primeira cena, chama a atenção uma festa no mínimo inusitada, já que a aniversariante é uma pessoa ausente. Não é para menos que notamos o desconforto da filha mais nova,  Pulengue (Ana Quamata), em estar presente ali e ainda ter que soprar a vela no lugar de sua irmã desaparecida. Ainda no mesmo episódio, temos uma virada, quando Pulengue vai a uma festa com sua amiga Zama (Cindy Mahlangu) e lá conhece Fikile Belhe (Khosi Ngema), que está fazendo aniversário no mesmo dia. Depois de notar semelhanças nos traços físicos de Fikile, Pulengue traça um plano para tentar descobrir se a garota pode ser sua irmã perdida.

Ao contrário do modus operandi de sucesso que a Netflix obteve em “Elite”, em que a história é narrada por meio de flashbacks, aqui o roteiro segue o percurso cronológico natural. E temos mais uma virada: devido a novas evidências descobertas pela polícia, acusações acabam caindo sobre o pai de Pulengue, Julius (Getmore Sithole, de “Free Willy – A Grande Fuga”), o que gera a reabertura do caso de sua irmã. A protagonista acaba sendo vítima de bullying e revidando, o que causa a reviravolta necessária da trama e, consequentemente, do plano da garota.



A mudança de escola faz Pulengue se aproximar mais de Fikile e do que ela acredita ser a verdade. E é neste ponto que a série começa a se perder. Como há muitos personagens, a subtrama de cada um ganha um espaço indevido, podendo levar o espectador a ficar cansado. Diferente do que acontece em “Dark”, outra produção não americana da Netflix, “Sangue e Água” perde, além de ritmo, conteúdo, pois os personagens não são tão bem trabalhados.

Na segunda metade da série, os redemoinhos começam a ficar maiores e cada vez mais óbvios, além de, ao longo dos episódios, a produção optar cada vez mais por se distanciar do tema central. O roteiro age com muita conveniência e prova disso é que Zama só volta a aparecer quando ela é necessária para dar seguimento à história. Depois, ela simplesmente desaparece. Fato este que se torna um desperdicio para o roteiro, porque, mesmo se tratando de uma personagem secundária, ela é a única que tem ligação com o mundo de Pulengue e de Fikile. Quando chegamos ao final, o que fica é uma sensação de que o percurso de alguns personagens não precisava ter sido esse e de que outros nem precisavam estar dentro da série, como é o caso da personagem Reece (Greteli Fincham).

Um ponto positivo de “Sangue e Água” é sua representatividade, que é visível em seu elenco e produção. Com direção assinada pelo promissor trio sul-africano Nosipho Dumisa, Daryne Joshua e Travis Taute, a série tira a ótica do “estrangeiro”, tão presente nas produções de Hollywood quando se trata de histórias situadas em outros países. Agora nos resta aguardar se a Netflix irá produzir a segunda temporada. Gancho tem, mas esperamos que ela venha com menos círculos e mais curvas, mistérios e emoções.

Nota: