Carros 2

Depois de uma trajetória de sucessos consecutivos de crítica e público, a Pixar derrapou pela primeira vez. Com “Carros 2”, o estúdio responsável por fazer filmes memoráveis, e não meros desenhos animados, como a trilogia “Toy Story”, “Up – Altas Aventuras” e “Ratatouille”, entre outros, se vê vítima de uma história pouco inspirada, que parece ter sido encomendada apenas para colocar os mais rentáveis personagens do estúdio novamente em evidência nas lojas de brinquedos.

Verdade seja dita, “Carros 2” poderia ser um filme lançado direto em DVD, exibido no Disney Channel ou mesmo dado como brinde junto a um dos milhares de produtos licenciados da franquia. O primeiro “Carros” já não era um primor, mas mantinha a qualidade dos filmes da Pixar, tanto no visual quanto no apelo universal da história, que acontece em um mundo onde não existem humanos: apenas veículos motorizados. Além dos carros do título, tratores, guindastes, barcos e aviões têm vida própria e se comportam como pessoas. Não chegam a ser Transformers (ainda bem), mas a ideia do antropomorfismo é a mesma.



A continuação vai além desse conceito já absurdo e incorpora uma trama de espionagem, numa clara referência aos veículos possantes e cheio de apetrechos que James Bond tem ao seu dispor em suas aventuras internacionais. A idéia funciona a princípio, mas o que poderia ser um bom filme de ação para crianças, torna-se um conto moral sobre “a importância de ser você mesmo”, bem clichê, coisa que John Lasseter e seus pupilos vinham evitando desde sempre.

Se os filmes da Pixar se tornaram famosos por serem preparados para “pais e filhos” curtirem juntos, “Carros 2” é claramente mais voltado para o público infantil, já que a história é protagonizada pelo coadjuvante do primeiro filme, o carro-guincho Mate, personagem que sem sombra de dúvida fez mais sucesso junto aos pequenos a partir do filme original (ganhou, inclusive, uma série de TV própria). O único diálogo que o filme faz com os adultos, além da referência a 007, acaba falhando ao trazer uma mensagem ecologicamente incorreta que envolve o uso de combustíveis renováveis pelos veículos do filme – algo surpreendente vindo do mesmo estúdio que fez “WALL•E“.

Assim, “Carros 2” torna-se um passatempo corriqueiro que, diferente dos outros filmes da Pixar, tem potencial para cair no esquecimento. Não cairá justamente pela dimensão do tropeço, ainda que eu duvide que alguém irá guardar rancores. De qualquer forma, o único aspecto que impede que este se torne o título mais fraco do catálogo da Pixar é uma mera questão técnica, ou tecnológica, já que, inegavelmente, é um filme visualmente mais bonito de se ver do que “Vida de Inseto”, realizado há 13 anos, período durante o qual a evolução da computação gráfica o faz parecer datado. No caso de “Carros 2” acontece o inverso: é a história que já chegou com prazo de validade vencido.

Carros 2 (Cars 2, 2011, EUA)
direção: John Lasseter, Brad Lewis; roteiro: Ben Queen; fotografia: Jeremy Lasky, Sharon Calahan; montagem: Stephen Schaffer; música: Michael Giacchino; produção: Denise Ream; com as vozes de: Owen Wilson, Larry the Cable Guy, Michael Caine, Emily Mortimer, Jason Isaacs, Thomas Kretschmann; estúdio: Pixar Animation Studios, Walt Disney Pictures; distribuição: Walt Disney Pictures. 106 min