Crítica: ENTRE NÓS, de Paulo Morelli

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Diante de uma bifurcação na estrada, é preciso escolher um dos caminhos, mesmo que você não conheça o destino a que eles possam levar. Há quem pare e fique pensando qual rumo tomar ou que volte atrás temendo o que está na frente. Acaba por não ir a lugar algum.

“Entre Nós”, dirigido por Paulo Morelli, é um filme de gênero, assim como o trabalhos anteriores do cineasta: “Viva Voz”, divertida comédia maluca adaptada para a contemporaneidade, e “Cidade dos Homens”, extensão do seriado de TV, que, aliás, tem muito em comum com este novo filme no que diz respeito aos laços de amizade que se formam e se rompem com o passar do tempo.



Essa história de amizade é o que poderia render ali um dos filmes muito bons que “Entre Nós” promete ser no início, já que nos faz vislumbrar algo como um “’Conta Comigo’ dez anos depois”. Em diversos momentos, o filme é realmente sobre aqueles seis amigos, estudantes e aspirantes a escritores, que se reencontram uma década mais tarde para ler as cartas que eles escreveram e enterraram no terreno de uma casa de campo, na belíssima Serra da Mantiqueira. Alguns foram bem-sucedidos na carreira, outros ficaram na mesma. Outros deram errado.

O filme consegue extrair bons momentos das reflexões que eles fazem de suas vidas, já adultos, e de suas conversas sobre tópicos como a literatura (obviamente), incluindo aí uma boa passagem em que questionam a influência do beatnik Jack Kerouac sobre as gerações posteriores. Apesar de bons momentos já terem tornado memoráveis filmes medianos, aqui não é o caso. Parte da culpa disso é que o roteiro, também de autoria de Morelli, não desenvolve seus personagens. Na verdade, os tipifica em subtramas: o casal que briga porque ela quer ter um filho, e ele não; o rapaz que é o bobão da turma e ainda é apaixonado pela garota mais bonita do grupo (e ela nada mais é do que isso); os amigos que poderiam ter vivido um grande amor, que não se concretizou devido à tragédia que os levou para caminhos diferentes.

É dessa tragédia que surge outro filme muito bom que poderia ter saído de “Entre Nós”. Não vale a pena entrar em detalhes, embora próprio filme não faça questão de esconder qual é o segredo que atormenta o personagem de Caio Blat, que pode ser considerado o protagonista. Algo que, na verdade, transforma-se numa contradição, pois existe uma atmosfera de mistério em torno do tal segredo, há todo um sofrimento em torno disso, mas, no fim, não há muito o que ser revelado, pois o espectador é capaz de “adivinhar” tudo desde o início.

Poderia ser, esse segredo, apenas uma desculpa para que “Entre Nós” fosse simplesmente um filme sobre a vida, isto é, sem estar necessariamente preocupado em resolver uma trama e ser um filme sobre o que a passagem do tempo faz, ou não, com as pessoas. Mas Morelli parece realmente mais interessado no suspense, que, infelizmente, é construído de forma absolutamente anticlimática, embora envolva uma questão importante – e é louvável que ele trate um desvio ético de forma tão grave, como se fosse um assassinato.

Auxiliado por seu filho, Pedro Morelli, na direção, Paulo está em seu terceiro longa e ainda demonstra certa insegurança na elaboração de algumas cenas, especialmente aquelas em que os personagens estão sentados, conversando numa roda de viola. O que era para ser um momento de tranquilidade, de relaxamento, surge como uma cena de filme de ação, dada a quantidade de cortes e de vezes que a câmera se move. Tudo bem que as pessoas estão se embriagando ali, mas não é o caso de nos passar a sensação de que tudo está girando. Além disso, irrita um bocado a insistência em fazer enquadramentos supostamente artísticos, colocando os atores nos extremos da tela e deixando o restante preenchido pelo “nada”, geralmente representado pelo fundo desfocado.

Com ótima performance conjunta do elenco, “Entre Nós” me parece ser fruto de uma tentativa de mapeamento, de se sentir seguro para fazer o filme perfeito, embora passe justamente o contrário: uma noção de que carece de mais firmeza e decisão para apostar no risco, para que pudesse transcender a partir de um desses possíveis filmes que ele vislumbra ser. ■

ENTRE NÓS (2013, Brasil). Direção: Paulo Morelli; Roteiro: Paulo Morelli; Produção: Paulo Morelli, Diane Maia; Fotografia: Gustavo Hadba; Montagem: Lucas Gonzaga; Música: Beto Villares; Com: Caio Blat, Carolina Dieckmann, Maria Ribeiro, Paulo Vilhena, Martha Nowill, Julio Andrade, Lee Taylor; Estúdio: O2 Filmes; Distribuição: Downtown Filmes, Paris Filmes. 100 min